Capítulo 20.5 - O Rei Corrompido
Capítulo 20.5 – O Rei Corrompido
27 anos atrás
Os recém consagrados Santos Cavaleiros, Hita Lessfor, Remu Zarfhan e Molly Jasal, faziam a sua primeira missão, não mais como aprendizes, mas sim como, oficialmente, Santos Cavaleiros.
O grandioso reino de Shina brilhava com o resplendor do sol, enchendo de ar os pulmões dos três, que se destacavam por suas roupas e trejeitos tão distintos um do outro. Hita usava um clássico kimono preto de combate, Molly era a que tinha as roupas mais despojadas do trio, e Remu, o que liderava a missão, estava vestindo uma belíssima capa branca, com uma camisa vermelha por baixo, e tinha a atitude e postura de um verdadeiro nobre que se tornou um Santo Cavaleiro.
— O reino de Shina passou 107 anos sendo um reino simples, e de repente eles conseguem produzir em massa pedras mágicas, isso não é nada normal. — Remu observou, com um semblante sério no rosto, enquanto eles passavam pelo portão de entrada.
— E vocês já sabem qual é o melhor lugar para buscar informações, não é? — Perguntou Molly, com um olhar irônico para Hita.
— É claro que não tem lugar melhor, você sabe que estamos certos, Reminho. Vamos? — Hita perguntou, de forma manhosa, abraçando Molly e Remu pelos seus pescoços.
Remu, desacreditado, ri da situação, colocando uma das mãos na testa, mas sem sinal de negação.
— Tudo bem, mas dessa vez a Molly paga. Já estou cheio de gastar meu salário com vocês dois.
— Eu tenho uma filhinha de um ano, não seja tão mal. — Molly diz, imitando Hita na forma manhosa de falar, apertando as bochechas de Remu.
— Aí Reminho, se você me ganhar na competição de bebidas, eu pago a conta inteira, mas se você perder, você paga a conta e eu arranjo pra você um encontro com a Alex. — Hita dá um sorriso convencido ao terminar a sua proposta. “Eu sei que você gosta de me ganhar em tudo.”
— Eu não acredito que você vai se rebaixar a tanto, na tentativa de me fazer perder de propósito.
Disse Remu, já no bar, enquanto a música tocava alta e animada, e os cidadão viam os dois competir, tomando shot atrás de shot, de rum. Eles se encaravam sorrindo, de forma competitiva, dispostos a não perder um pro outro, afinal, quanto mais a competição durasse, maior seria a conta.
— Esses dois não tomam jeito mesmo. — Molly disse para si mesma, com um singelo copo de uma batida de frutas não contendo álcool. “Embora eu pudesse ganhar dos dois, não quero que minha filha cresça ouvindo que a mãe é um beberrona.”
— Seus cabelos escuros como o céu noturno casam muito bem com os seus olhos acinzentados, uma beleza incomum aqui em Shina. Presumo que os três não sejam daqui. — Disse o jovem barman.
Os cabelos acinzentados do homem e seus olhos verdes pareciam despreocupados, enquanto ele limpava uma das canecas no balcão.
— Se você tentou me dar uma cantada, esse foi um bom começo, gosto de homens observadores. É uma pena estar limpando uma caneca que já estava limpa. — Molly brincou, se sentando no bar com o homem que continuava com a caneca em mãos.
— As pessoas ficam pouco à vontade com um desconhecido os encarando nos olhos. Se me contar o que querem aqui, posso ajudar com um preço.
— Primeiro, quero que me diga, o que esses olhos verdes puderam observar de nós três.
O homem, um pouco mais jovem que Molly, continuava limpando aquela caneca enquanto evitava olhar para o busto avantajado da mulher em sua frente, vendo como ela, propositalmente, tentava distraí-lo.
— O ruivo de cabelos bagunçados, tem músculos no antebraço bem trabalhados, o que significa que é hábil com as mãos, as roupas sugerem um lutador mão a mão ou um espadachim.
— Continue. — Molly disse, bebendo, a curtas goladas, a sua batida.
— O homem de cabelos pretos, parece ter uma origem nobre, mas não conheço nenhum que seja idiota o bastante para disputar bebidas com um guerreiro, em um lugar como este.
“Ênfase na parte dos idiotas.” — Ela pensou.
— E você, está olhando cada canto deste bar desde que chegou, com a conveniência adicional de que todo homem que olhou pra você sofreu um pequeno deslize “acidental”, Santa. — Satirizou o homem, antes que acendesse o seu cigarro.
— Estava te achando fofo, até acender esse cigarro podre. “Ele parece ser um pouco mais novo que o Remu e, apesar de ser um barman, as suas habilidades de dedução são assustadoras.”
— Você é bonita mas, não me leve a mal, meu tipo de mulher tem um pouco mais de corpo. — Ele retrucou.
— Entendi, toquei na sua ferida. Molly Jasal, muito prazer. — Ela disse, estendendo sua mão.
— Armano Yabu, o prazer é meu. — Ele respondeu, beijando as costas de sua mão. — Mas vamos aos negócios. Vocês vieram investigar nosso reino por ele está crescendo muito, não é?
— Como você-
— Não precisa disfarçar, eu tenho minhas fontes e vocês tem a mim.
— Dependendo da informação, posso melhorar o pagamento.
Yabu, por alguns instantes, encarou a mulher com um olhar sagaz, desviando para trás dela, onde o homem de cabelos vermelhos dançava de uma forma, particularmente, ridícula, comemorando, enquanto seu companheiro parecia estar apagado em cima da mesa.
— Aquele ali gosta de atenção. Quero ele fora da jogada e 30% do pagamento adiantado.
— Mas você nem me contou se a informação que tem vale a pena.
— Se achar que não, você sabe onde me encontrar. — Ele respondeu com ironia.
“Esse jeitinho dele está me incomodando… Ele é inocente ao ponto de ser tão aberto? Ou isso tudo é confiança demais?”
Molly, ainda em dúvidas, vira as costas e vai em direção a Remu, que estava quase deitado na mesa, sussurrando em seu ouvido.
— Eu sei que você fingiu perder pro Hita, então só escute. O garoto suspeito no bar, acho que ele sabe que somos santos cavaleiros. Disse ter informação. — Ela continuou olhando em volta, para ter certeza que ninguém a ouvia, rindo ao ver Hita disputando queda de braço com dois bêbados.
— E a missão? — Remu sussurrou, um pouco tonteado.
— Se não aceitarmos ir com ele, pode ser que ele dê a informação que nós somos cavaleiros a alguém.
— Então o Hita paga a conta.
— Ele não quer o Hita nisso, ele chama muita atenção.
Molly disse, vendo Hita tendo seu nome saudado por bêbados enquanto conversava com eles, bebendo ainda mais, e após alguns segundos de decepção interna, Remu sorri abrindo seus olhos, ainda deitado na mesa.
— Se você pagar a conta, eu pago a informação.
Molly é surpreendida por essa audácia, mas aceita em silêncio, com um sorriso de contentamento nos lábios, concluindo a negociação com Yabu.
Durante a noite, Molly e Remu admiravam o luar e as estrelas, andando lado a lado por entre as ruas, encontrando Yabu fechando o bar à meia noite, como haviam combinado. Em silêncio, eles caminharam encapuzados pelas ruas estreitas, até chegarem em uma casa abandonada.
Molly usava constantemente a sua magia, explorando através da escuridão se era uma armadilha ou não, já que a noite era o seu território mágico, eles não seriam enganados. Sem hesitar, eles continuam o seguindo até uma bifurcação na parede do porão daquele local.
— Eu não gosto de ser o questionador, mas isso está cada vez mais suspeito. Onde está nos levando? — Perguntou Remu.
— Perdão pela minha atitude, mas já sabia que santos cavaleiros viriam. — Yabu respondeu.
O som da luz tomando forma era como um coral angelical na forma de uma espada, seu olhar ainda parecia um pouco tonteado pelo álcool, mas estava firme o bastante para fazer algo quando necessário.
— Ela entregou que eram vocês, qual é, era só olhar no chão e ver as suas sombras zombando com os meus clientes.
— Isso não explica como sabia que viríamos. — Remu respondeu.
— O Ancião Aaron Mathell. Meu tio e ele são velhos amigos. — Yabu respondeu, acendendo o seu cigarro antes de entrarem naquela fenda.
— Você fuma tanto assim mesmo? — Molly perguntou, tentando abafar o cheiro de seu nariz.
— Todos morrerão um dia. E se o cigarro me matar, posso dizer que, até lá, vivi do jeitinho que eu quis. — Yabu respondeu com um jeito meio bobo, antes de ser o primeiro a entrar na bifurcação.
— Diga-me, se tem contato com o Ancião Aaron, suas informações já não podiam ter sido passadas direto para ele? — Remu perguntou, andando por aquele local escuro.
— É que existe a chance de um demônio superior estar envolvido. E eu sei me virar bem numa briga, mas fala sério, um santo cavaleiro ou demônio superior acabaria comigo rapidinho. — Yabu continuou, rindo como se houvesse contado uma piada saturada.
— Ah, cada um tem seus méritos, os fortes resolvem conflitos, os inteligentes impedem que eles aconteçam. — Molly disse, dando um soquinho de leve em Yabu.
Os dois se encaravam na escuridão daquele túnel, onde Molly começava a notar como os olhos e cabelos acinzentados de Yabu contrastavam na escuridão, ele tinha um rosto tão bem cuidado que mal lembraria um adulto, se não fosse o cigarro em sua boca. Ao mesmo tempo que mantinha o mesmo olhar focado o tempo inteiro, quase como um estado constante de precaução, era o mesmo que ele tinha no bar.
“Que tipo de vida ele levou para ter olhos que sempre estão em alerta?” — Molly se perguntou.
— O que é esse som? — Remu questiona, ao ver uma luz no fim do túnel.
— Essa é a merda que eu queria mostrar a vocês. — Yabu respondeu ao chegarem.
Não demorou muito para notar o local onde eles estavam. Aquele estreito túnel dava em uma enorme ravina, onde estavam repletos de demônios, era uma espécie de fronteira mágica, onde o mundo humano e o mundo demoníaco se interligavam.
Os soldados reais de Shina contrabandeavam em mão dupla, armas, livros, mapas, materiais orgânicos e inorgânicos, e de repente, para Remu, tudo fez sentido. O reino, outrora vasto mas simples, havia se tornado um reino próspero por meio do contato com o mundo dos demônios. Criando tecnologias as quais nem mesmo os demônios possuíam ainda, e nem os Santos tinham conhecimento, assustando-os com a situação.
Os demônios carregavam mulheres nuas e homens acorrentados para o seu prazer, bebendo e festejando com a guarda real de Shina, que resguardava o local por eles.
— Agora entendem o porquê do sigilo? — Yabu diz.
— Aqueles homens e mulheres. Por que? — Molly perguntou, confusa e aflita.
— Dívidas, suspeita de traição, criminosos… Um problema que eles transformaram em lucro.
Lá em baixo, onde estavam os demônios e os humanos, um homem acorrentado de repente se liberta de suas correntes, roubando a lança de um dos guardas reais e cortando a sua garganta com a força que suas unhas afiadas o permitiam, as quebrando no processo.
— Seus traidores, como vocês ousam nos vender para demônios?! — Gritou o alto homem negro, pronto para a eventual batalha.
— Olha só, um humano qualquer achando que pode fazer alguma coisa sozinho. — Disse um dos demônios, bebendo e rindo, acompanhado de seus companheiros. — É sério, o que está tentando provar, hein?
— Que os humanos só desistem quando morrem. — O homem respondeu, cravando a lança no chão.
Várias flechas começam a ser disparadas contra os demônios e soldados reais que ali estavam, a rebelião entre eles começava, com um demônio superior se revelando enquanto a pilha de corvos aumentava.
Os três observavam de cima como o demônio superior se revelava uma mulher, dominando a terra como o seu próprio território, e desestabilizando o chão para facilitar o seu avanço por dentre os demônios.
— Molly! Eu cuido do Demônio superior, cuide dos outros e-
— Ela já se mandou. — Yabu o interrompeu, fazendo um barulho de ‘fiu’ com a boca, gesticulando com a mão.
Novamente encarando o local, Molly, com sua bela roupa, parecia apenas uma moça inocente caminhando através do sangue dos soldados que ali lutavam, carregando consigo um guarda-chuva que atirava facas em qualquer direção aonde ela avistava um inimigo, chamando a atenção da demônio superior que fazia suas espadas de terra tão afiadas e duras quanto o aço, cortando os humanos que tentavam se rebelar.
— Que magia interessante, uma vadia das sombras. — A Demônio Superior disse.
— Que meiga, te chamaria de vadia também, mas acho que, no máximo, pagariam para não ficar com você. — Molly respondeu. “Só preciso mantê-la distraída, a manifestação incorpórea está resgatando os mais feridos primeiro.”
— Mas que mulher audaciosa. — Disse a Demônio superior, saltando para o ar e descendo como um cometa na direção de Molly.
Falhando em prever como aquela magia funcionava, a espada da Demônio passa direto pelas sombras, voltando na direção de seu rosto e cortando parte de sua boca até um pouco mais atrás de seu ouvido.
— Eu só preciso saber, o Rei de Shina está envolvido nisso, não está? — Molly perguntou, com um sorriso inocente.
A face de raiva da demônio superava a sua dor, fazendo com que ela tentasse invocar espinhos de terra do chão que, graças a influência da magia de Molly, aparecem embaixo da própria demônio, que gemeu de dor pelo próprio erro mortal.
— Uma pena mas, acho que se balançar uma árvore, uma testemunha igual a você cai mais vinte. — Molly proferiu, com cansaço em sua voz, a finalizando ali mesmo.
Remu, a princípio, havia sido deixado para trás, mas foi aquele que derrotou não só os guardas reais que ali estavam, como também os demônios que tentavam fazer alguma coisa contra eles.
O homem que havia iniciado a rebelião, se prostra diante de Remu, o agradecendo por sua ajuda.
— Os céus tiveram piedade de nossas almas, muito obrigado! — Ele agradeceu.
— Não precisa de agradecimentos, um coração virtuoso sempre será recompensado. Como o seu, quando se pôs em risco pelos seus. — Remu respondeu estendendo-lhe sua mão.
— Obrigado, Santo Cavaleiro, obrigado. — Ele chorou, aliviado.
— Vocês foram salvos, no entanto, soube que muitos daqui eram criminosos, e pelo justo, devem pagar por seus crimes. Assim, eu lhes ofereço a chance de serem detidos pacificamente e levados até Neozero, onde serão julgados por seus crimes de forma humana.
— Ninguém vai me levar preso de novo, escutou? — Gritou um dos homens ao se levantar, preparando o seu arco e flecha contra Remu.
Antes que Remu pudesse responder, o baderneiro é apagado com um golpe na traseira de seu pescoço, tendo o arco tomado de sua mão, revelando que aquele quem chegará, sorrateiramente, havia sido Yabu.
— Calem a boca, ele acabou de salvar a vida de vocês. Se querem reclamar, ao menos tenham a inteligência de fazer isso quando estiverem seguros, idiotas. — Yabu disse enquanto dava mais um trago em seu cigarro.
— Então é isso, vamos só levar eles daqui e acabou? — Molly perguntou a Remu.
— Temos que escondê-los, o destino deles vai ser definido se o Rei de Shina sabia ou não dessa situação, levando em conta que, pela distância, calculo que estamos próximos ao castelo. Leve eles para Alexander Servil. Ele é um homem duvidoso, mas gosta de dinheiro. — Remu ordenou.
— Que chatice, a parte pesada fica pra mim? — Molly perguntou, arrastando um de cada vez para dentro de sua sombra.
— Eu quem tive que dopar o Hita, tem noção do quão isso fere o meu orgulho? — Remu disse, um pouco incomodado.
— Desculpa, mas quando eu tentei o levar pro quarto ele achou que eu queria dormir com ele. Então, sem chance. — Ela respondeu, fazendo um X com os braços, antes de desaparecer na escuridão.
Os segundos passavam em silêncio com Yabu e Remu olhando em volta, buscando mais pistas sobre o que estava sendo contrabandeado de Shina. A ravina mal iluminada, mesmo à noite, trazia uma sensação de fim de tarde, e um silêncio, o qual era quebrado agora por uma sequência de palmas.
— Bravo, Santos Cavaleiros. Devo admitir que aquela Demônio Superior era um incômodo por aqui.
Remu se virou, surpreso, deixando o nervosismo tomar conta de seu rosto ao ver a figura que o cumprimentara. O Rei de Shina, com uma escolta de dez Redaris logo atrás dele. O tapa olho do Rei cumpria um propósito, emanando uma magia obscura notada por Remu.
— Vossa Majestade, isso é obra sua? — Remu perguntou.
— Os criminosos estavam sendo negociados sob minha supervisão e autoridade, sim. — O Rei respondeu.
Remu encarou Yabu por uns instantes, voltando a sua atenção para os Redaris que, como cães selvagens, esperavam a ordem de seu dono.
— As leis do tratado entre reinos não serão violadas apenas pelo egoísmo de um rei ganancioso. — Remu proferiu, ao criar uma espada de luz. — Yabu, se puder, lute. Se não, se esconda e me aguarde.
— Minha força não é nada, mas tudo bem, posso segurar um ou dois por algum tempo. — Yabu respondeu.
— Esses criminosos não merecem piedade alguma, as suas mortes estão causando uma evolução, tecnológica e científica, jamais vista em nosso mundo. — O Rei proferiu com um voz rouca e com uma expressão séria no rosto.
Os cabelos pretos e brancos do rei cobriam um pouco de sua face, com suas mãos apoiadas em seu cetro dourado, contendo um enorme cristal sangue em sua ponta.
— Mas você está errado, você está jogando pessoas que podiam ser redimidas apenas para satisfazer o seu ego e, pelo poder garantido a mim, como um Santo Cavaleiro, Rei Amorin Canellas, eu irei destituí-lo pessoalmente de seu posto.
— Isso vai acabar mal… — Disse Yabu.
— Nós, Redaris, Humanos, somos superiores aos demônios. Com as armas que estamos construindo, não será difícil matá-los e você, deliberadamente, quer salvá-los da morte? — O Rei perguntou.
— Apenas o tolo escolhe a violência como primeira opção, então sim, se salvá-los da morte for uma opção para a paz, é o que eu vou fazer.
— Quanta hipocrisia, família Karumasin. Derrubem o traidor e matem o Santo Cavaleiro.
Os dez, como ordenado, correm para cima do Santo Cavaleiro, que tem sua magia neutralizada pelo cajado do Rei Amorin durante 15 segundos. Remu é capaz de lutar contra oito deles em pé de igualdade, desviando os golpes dos Karumasin, enquanto Yabu, sozinho, tentava lidar com dois deles, desviando e fugindo de seus ataques.
Como um grupo, eles atacavam com a força que podiam, um chute nas costas, joelhada no estômago, um gancho no queixo e, por último, uma facada bem perto do coração, eles eram um grupo coordenado, que haviam derrotado Remu Zarfhan, ao selar os seus poderes. E quanto a Yabu, havia sido derrubado bem antes de Remu, que, aos poucos, sentia seu corpo pesar ainda mais.
***
Uma figura tonteava pela escuridão, enxergando pouco do que estava a sua frente.
O Rei ria, quase se engasgando, ao ver o Santo Cavaleiro derrotado, fazendo com que seus homens o pendurassem em uma bela e simbólica cruz, com uma faca em seu peito, sendo aquilo que o impedia de morrer.
— Viu, Santo Cavaleiro, quando se desafia o oponente errado, coisas ruins acontecem. — O Rei caçoou.
“Me desculpem, achei que vocês… conseguiriam matá-los… Droga…” — Yabu se lamentou, tendo o corpo ensanguentado no chão.
— Aí, seus merdas, se eles morrerem, eu vou matar todo mundo. — Disse a voz meio embolada.
“Hita… como você… droga, a minha voz não sai”. — Remu pensou, com o seu corpo pesado e frustrado, por não conseguir dizer nada.
A visão de Remu, embora cansada, podia ver o seu amigo claro como o dia, atravessando a noite em chamas azuis, e mesmo ele estando cambaleante, por causa da escolha dele de apagá-lo, ainda assim, ele forçava os seus próprios pés a se moverem.
“Me desculpa, como pude ser tão idiota?”. — Remu tinha lágrimas escorrendo de seus olhos, enquanto a sua boca tentava pronunciar um simples pedido de ajuda.
— E você, quem devia ser? — O Rei perguntou.
— O melhor amigo, do tapado aí atrás, e quero saber quem machucou ele. — Hita respondeu, antes de tropeçar e cair no chão.
Os Karumasin riam de como aquele Santo, envolto em chamas, era patético, porém, antes que pudessem sequer pronunciar algo, o olhar enfurecido pareceu encarar o fundo de suas almas quando uma barreira de chamas azuis surgiu entre Yabu, Remu e os Redari, prendendo seus inimigos com ele.
— Patético. — Disse o Rei, usando seu cristal de sangue para selar as chamas de Hita.
— Quem foi?! — Hita questionou, aos gritos, antes que as muralhas, antes de chamas, se tornassem raios azuis.
O grito de Hita ecoou num gravo forte como um trovão, até que a figura furiosa saltou, impulsionado pelos raios, para cima do rei, tendo uma lança jogada em sua direção. Com um pulo, Hita girou junto com a lança, arremessando-a de volta com a força de seu raio, atravessando o peito do primeiro Karumasin, que morreu eletrocutado pela muralha.
“Um santo divergente?!” — Pensou o Rei.
Em choque, ele tenta cortar seu suprimento mágico pela segunda vez enquanto Hita disputava força física, eletrocutando outro dos Karumasin. No entanto, com um grito de Hita direto em seu rosto, o segundo Redari também queimou até a morte.
“Cada vez que eu selo um de seus poderes, ele sente e muda, automaticamente, para outro.” — O Rei começava a suar, nervoso com a situação.
“Esse Santo Cavaleiro não teme se entregar ao seu ódio. E, pelo visto, vai ser um grande empecilho…” — Disse uma voz feminina na mente do rei.
“O Cristal de Sangue não funciona contra ele, o que devo fazer, Sábia Deusa?” — O Rei perguntou, assustado, em sua mente.
Sem sinal de resposta, ele sente uma dor absurda em sua cabeça, retirando as faixas que ali estavam, mostrando que um de seus olhos estava completamente avermelhado. E onde deveria haver o branco de seus olhos, agora eram vermelhos como o sangue em ambos, um sinal de que a Deusa não mais poderia habitar em sua mente. E, para que o branco de ambos os olhos escurecessem daquela forma demonstrava que o Rei havia resistido ao controle dela completamente, ou que a Deusa não poderia mais habitá-lo.
— Esse foi o preço por abrir mão da sua humanidade? — Hita perguntou, ofegante, segurando o corpo de um dos Karumasin em sua mão, e uma espada de raios, e chamas azuis, na outra.
O medo nos olhos do Rei era palpável, vendo o seu próprio reflexo nos olhos do homem que lhe enforcava com aquela aura assassina. Os gritos de socorro não saíam de sua boca, e os Karumasin queimavam até a morte. Ele tentava se afastar enquanto seu corpo tremia, mas apenas se arrastava no chão.
“Ele não é um Santo Cavaleiro comum, ele é cruel… ele é forte… ele… ele…”.
— Medo e desespero podem ser algo novo para um Rei, mas não tem problema, você não vai precisar aprender a lidar com isso.
Por um momento, o Rei apenas riu. E Hita não soube o motivo, nem ao menos quis saber o por que o rei continuava a rir, enquanto seu corpo queimava até a morte, ele apenas pegou o cristal de sangue e, ansioso, correu até a cruz onde estava o seu amigo.
Segurando o cristal e seu amigo em seu colo, ele e Remu se encararam, vendo como a morte dele podia estar muito perto. Remu estava agradecido por dentro, por seu amigo estar ali em seus últimos momentos, então ele acaricia o rosto de Hita, e seca as lágrimas que corriam por seu rosto.
— Você me prometeu, o encontro com a Alex… — Remu disse, com a sua voz fraca, e um sorriso idiota.
— Momento errado, amigo… — Hita respondeu, se deixando rir um pouco, enquanto as lágrimas caiam.
Deixando o corpo de Remu ao lado do corpo, cansado e machucado, de Yabu, ele se senta entre os dois, com o cristal de sangue entre eles.
Hita pronunciava uma oração antiga, pondo a si mesmo em risco e suportando a dor de seus ossos quebrarem. Cada hematoma, cada corte, diferentes partes de seu corpo sofriam, molhando suas roupas com o próprio sangue, ferimentos que pareciam vir de lugar nenhum, enquanto as feridas, tanto internas quanto externas, de Remu e Yabu desapareciam.
— Feitiço Celestial, Antítese do Sacrifício. — Ele pronunciou com calma, vendo como seu amigo e o garoto junto a ele se curavam.
— O-o que você fez? — Yabu perguntou, ao se levantar, surpreso.
— Idiota! Sabe que os feitiços são proibidos! — Remu reclamou, tentando se conter em tocar o corpo de Hita.
— Não é por isso que me chamam de Benevolente? Nunca deixaria meu melhor amigo na mão. — Hita respondeu, ofegante, devido ao fardo da ferida dos dois terem sido passadas e espalhadas por todo o seu corpo. — Não podiam ter tentado apanhar um pouquinho menos? — Ele perguntou rindo.
— Que tipo de cara é você? — Yabu disse, impressionado.
— O melhor que nós temos. — Remu respondeu, deixando algumas lágrimas caírem de seu rosto.
— Então, quer dizer que você só perdeu porque queria o encontro com a Alex? — Hita perguntou. — A Molly me contou quando encontrei ela no caminho.
— Huff… Você não toma jeito. — Remu respondeu, se levantando e secando o rosto.
— Jeito? Eu? Dispenso. — Hita se levanta sozinho.
— E quanto aos corpos? — Yabu os questionou, olhando em volta.
— Tanto faz, mesmo que descubram o que aconteceu aqui, não vão poder denunciar o crime. Cuidamos do resto depois, agora eu só quero uma bebida. — Hita disse, ainda andando com o corpo pesado por seus ferimentos.
— E o que vai acontecer com toda essa operação? — Yabu, novamente, pergunta a eles.
Um momento de silêncio ocorreu entre os três, antes que Hita encarasse todo o local, e começasse a ir embora.
— Com sorte, todos que sabiam sobre isso podem já estar mortos. Vou pedir que algum santo cavaleiro guarde o local por um tempo. Não eu, to todo quebrado. — Ele disse, envolvendo seu corpo em magia, queimando um pouco de seus ferimentos para cauterizar suas feridas.
— Queria ver você me surpreender algum dia. — Remu caçoou.
— Então fica com essa, a Molly estava me dando mole. — Ele respondeu, fazendo uma pose de garanhão, antes de perder o equilíbrio e cair no chão.
“Hita… um Santo um tanto diferente, quem sabe o que mais ele pode mostrar?” — Yabu pensou, os seguindo.
— Não vai contar a ninguém que chorei, não é? — Remu perguntou, um pouco envergonhado.
— Não vi ninguém aqui chorar. Se alguém perguntar, eu caí de uma escada. — Hita respondeu.