Capítulo 07
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**Capítulo 7: O Fim?**
Raven soube no instante em que o viu: aquele homem era o juiz , o responsável por julgá-lo de forma fria e implacável. A presença do juiz era sufocante, quase esmagadora, como se o próprio ar ao seu redor estivesse impregnado de medo.
Ele não se parecia nem de longe com um ser celestial, o que só aprofundava a inquietação de Raven.
O ambiente ao seu redor era muito diferente do que ele imaginava ser um tribunal celestial. Tudo era sombrio, o ar denso e pesado, como se carregasse um fardo insuportável.
Raven percebeu que não estava mais nos céus; este lugar era um limiar entre o céu e algo pior. Seu rosto, antes impassível, agora refletia desespero e inquietação. Ele cerrou os punhos com força, mas permaneceu em silêncio, atento aos movimentos do juiz, que começou a falar.
— O tribunal de hoje é, sem dúvida, especial — disse o juiz, sua voz carregada de uma solenidade estranha.
— A última vez que julgamos um herdeiro do tabu foi há milênios.
E este aqui, além de ser fruto de um erro, é filho de Azazel, um ser outrora respeitado nos céus, apesar de sua origem repulsiva.
As palavras saíam dos lábios do juiz com uma frieza cortante, enquanto ele mantinha as mãos cruzadas na altura do umbigo, como se se segurasse em algo invisível.
Raven o observava atentamente. Cada gesto, cada pausa era analisada com precisão. Ele sabia que qualquer detalhe poderia ser a chave para sua sobrevivência.
**Droga, há muitos anjos aqui… Fugir é impossível. Eu tenho que manipular esse tribunal, mas eles sequer parecem dispostos a me ouvir…**, pensou.
O medo pulsava nas veias de Raven, mas ele lutava para manter a calma. Havia uma presença naquele lugar, algo opressor que supera qualquer coisa que ele já havia sentido. Quando essa presença entrou em seu campo de percepção, seu corpo congelou. Ele não ousou olhar diretamente, mas sabia que, se o fizesse, seria aniquilado instantaneamente.
A criatura era uma distorção na realidade. Sua presença era como um buraco negro, sugando tudo ao seu redor, desafiando as leis do espaço e tempo.
O juiz percebeu a hesitação de Raven, e, como uma explosão em sua mente, uma voz aterradora gritou:
—NÃO OLHE PARA M—!
A mente de Raven desmoronou, deixando apenas a primeira letra, “M”. Antes que pudesse processar, a voz do juiz ecoou novamente, agora tomada pelo pânico:
— Você quer nos matar?! Não ouse fazer isso novamente, ou todos estaremos aniquilados!
O juiz, que até então mantinha uma postura firme, agora tremia visivelmente. Raven percebeu o pânico disfarçado sob sua fachada de autoridade. Ambos tentaram recompor-se, mas a tensão era palpável.
— Perdoem-me, senhores — o juiz disse, forçando uma formalidade que não mais convencia.
— Divaguei um pouco. Retornemos ao caso. Diante dos pecados cometidos por Raven Alaric, filho de Azazel e herdeiro do tabu, ele deveria ser condenado à inexistência. No entanto, como somos seres piedosos, permitirei que ele se defenda.
Um riso insano e distorcido ecoou pelas paredes do tribunal, arrepiando Raven até os ossos. Era uma risada monstruosa, uma melodia macabra de desprezo e desespero.
— Hahahaha! — Os anjos riem selvagemente, algo que ultrapassa qualquer noção celestial. Raven sentiu o terror crescer dentro de si, mas ainda tinha esperanças de sair vivo dali.
O juiz avançou. Sua figura imponente era seis vezes maior que a de Raven, e sua presença parecia dobrar o espaço ao redor. Cada passo fazia o chão vibrar. Raven suava frio, com um nó apertado na garganta.
— Raven Alaric — disse o juiz, com uma voz grave e zombeteira —, antes de começar seu interrogatório, faça o seguinte juramento: “Eu prometo, em nome da verdade, dizer somente a verdade e nada além da verdade diante do tribunal celestial.”
Raven, mesmo aterrorizado, sabia que não tinha alternativa.
— Eu prometo, em nome da verdade, dizer somente a verdade e nada além da verdade diante do tribunal celestial.
Assim que as palavras deixaram sua boca, sentiu algo invisível apertá-lo, como correntes que o prendiam por dentro. Seu coração disparou.
— Hahaha! — o juiz riu novamente.
— Lembre-se: sob esse juramento, é impossível mentir ou omitir a verdade.
Raven assentiu, mantendo a expressão séria.
— Não pretendia mentir.
O tribunal ficou em silêncio por um instante. Os anjos o olhavam surpresos pela sua calma. O juiz sorriu, deleitado pela audácia do jovem.
— Então… vamos começar.
— Raven Alaric, em algum momento da sua vida, você encontrou seu pai?
Os olhares de todos os anjos da plateia cravaram-se em Raven, tentando invadir sua mente. Ele respondeu com tranquilidade:
— Fui criado pela minha mãe. Acreditei que meu pai havia morrido em um acidente de carro, mas recentemente descobri que ele foi executado por me trazer à vida.
O ódio queimava dentro de Raven, mas ele sabia que não podia mentir. Seu ressentimento ia além de Ismael; era dirigido a todos ali presentes.
O juiz balançou a cabeça, pensativo.
— Certo. Tínhamos dúvidas se seu pai havia deixado algo para você… Mas, ao que parece, não, certo?
— Ele não me deixou nada — Raven respondeu com amargura —, além de uma foto.
Os anjos olhavam para Raven com nojo, mas mantinham o silêncio.
O juiz ergueu a mão, zombeteiro.
— Raven Alaric, você nutre algum ódio por nós?
Cada palavra do juiz caía sobre Raven como pedras. Mas sob o medo crescente, o ódio queimava como brasas, esperando o momento para explodir.
Raven apertou os lábios, cravando as unhas nas palmas das mãos, antes de explodir em raiva:
— Vocês acham que isso é uma piada, seus vermes?! Vocês invadiram minha casa, mataram minha mãe, me prenderam por quinze dias para esse julgamento ridículo…
— O rosto de Raven expressava o mais profundo ressentimento. Ele não conseguia evitar dizer a verdade devido às regras impostas pelo juramento, mas isso pouco importava para ele; mesmo assim, continuou a falar.
— Ódio? Eu os odeio mais do que qualquer coisa! Meu ódio por vocês consome cada fibra do meu ser, e um dia… eu vou aniquilar todos vocês!
Os anjos riem descontroladamente.
— Hahahaha! — Para eles, Raven era uma piada, uma formiga tentando desafiar os céus.
O ser “M”, isolado no tribunal, observava em silêncio. Para ele, Raven era uma ameaça latente, o filho de Azazel, o décimo quinto anjo mais poderoso, um querubim lendário. Mesmo assim, ele permaneceu quieto.
Raven, ao perceber que ninguém o levava a sério, se acalmou.
**Ótimo… Continuem me subestimando. Isso só me favorece.**, pensou. Ele sabia, no entanto, que suas palavras teriam consequências.
O juiz parou de rir, encarando-o com desprezo.
— A brincadeira acabou, sua formiga patética.
Ele bateu as palmas, e o som ecoou de forma insuportável. O espaço ao redor começou a se distorcer, e uma fenda se abriu como a boca de uma besta primordial, suas bordas distorcendo o espaço ao redor, tragando a própria luz, como se estivesse faminta pela existência de Raven.
— Diante da lei celestial,e diante dos pecados que mancham a sua alma, Raven Alaric, herdeiro de Azazel, a única sentença é o apagamento da sua existência. Concordam?
Os anjos ergueram as mãos em apoio, cheios de satisfação. O ser “M” desapareceu, desinteressado. Raven entrou em pânico.
**Droga… Vou morrer assim? Sem nem dar um golpe nesses desgraçados?!**, pensou.
Num ato irracional, movido pela emoção, Raven avança em direção ao juiz, em um segundo, ele estava a metros de distância, e no outro, seu punho colidia com a face inabalável do juiz. O som do golpe foi abafado pela surpresa coletiva dos presentes, como se o tempo tivesse parado para testemunhar o impossível.
A confusão tomou conta do tribunal.
**Esse moleque é louco?**, pensaram os anjos.
Alguns sequer entenderam o que havia acabado de acontecer.
O juiz ficou imóvel, surpreso demais para reagir. Embora o golpe não o ferisse, o choque fora suficiente. Antes que pudesse reagir, Raven se lançou em direção à fenda em um segundo, jogando-se no abismo.
Enquanto caía, Raven riu, satisfeito por ter reagido.
**Se eu morrer, que seja do meu jeito.**, pensou.
Com um gesto irreverente, virou-se para o juiz e mostrou-lhe o dedo do meio.
Então, mergulhou no abismo profundo.
— Acho que é o fim…
— murmurou para si mesmo, enquanto seu coração acelerava e seu corpo começava a ser esmagado pela força do vazio ao seu redor.
O espaço ao redor se fechou, e a escuridão tomou conta de tudo.
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Ilustração: O abismo